segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Quando Dei Por Mim





Você não pediu licença, não limpou os pés no tapete da porta. Entrou e se jogou no sofá. Sujou meu chão de areia. Arrotou bem alto que era para mostrar que a casa não era mais só minha. E foi logo pegando o controle para você –não só da televisão, mas da minha vida também –Não avisou. Não pediu desculpas pela hora que vinha. Não ligou para perguntar se podia vir. Não chegou. Invadiu. Você me invadiu. Antes que eu pudesse piscar os olhos. Antes que eu pudesse me dar conta. Quando eu vi, já estava cercada e não tinha mais jeito de fugir.


Não me fez querer fugir. Não me cativou porque pareceu entender os gritos histéricos que atravessavam minha alma: não me cativa, não me cativa, por favor, que eu sou livre e não vou aguentar ficar presa para sempre responsabilizada por ninguém. Ao invés disso, me conquistou como ninguém havia sequer tentado antes. Arrebatou-me para você. Com esse sorriso e esse jeito de “pode falar o que você quiser, não tô nem aí, nem vou embora” de um jeito que sua bagunça em minha vida se transformasse em meu mais novo jeito de organizar as coisas. Arrumar pela variação de cor era perda de tempo, embola tudo que o melhor é viver a vida.


Feito furacão, passou por minha vida e deixou tudo de pernas pro ar. Me virou do avesso. E me fez ver que, assim, do avesso, a minha vida era muito melhor. Como se eu fosse peça de xadrez, me arrancou da minha direção cuidadosamente traçada e reformulou todo meu destino. Está aí, é isso mesmo que você me fez, você arrancou: meus medos, minha inquietação, minha rotina, meu tédio, meu coração. Não me deu tempo para pensar. Quando vi já estava sem chão e sem equilíbrio, perdida em você.


Você segurou a minha mão e não soltou mais. Nem quando eu ainda pedia. Você ria, sem me levar a sério. Você nunca levou minhas inquietações muito a sério. Rolava os olhos quando eu começava a falar de liberdade, bocejava descaradamente quando eu queria impor limites. E dormia, com os braços em minha volta, enquanto eu tentava me soltar. Quando eu vi, já estava gostando disso, da minha nova moradia, dos seus braços.


Preencheu cada pedaço da minha casa e iluminou cada canto escuro de minha alma. Me apresentou o céu, me levou ao inferno, e me ensinou que a terra é um lugar cansativo demais para se viver. Me arrematou num leilão em que eu era o maior lance. Me ganhou num jogo que eu costumava ganhar. Me tirou da minha partida de xadrez e me transformou em sua rainha. Me fisgou, como um bom pescador, como um tubarão que procura por presas pequenas por aí.


Quando dei por mim, já recebia convites para festas como se fosse casada, minha programação de domingo era futebol na televisão, e meus enfeites em casa tinham fotos suas. Quando vi, já havia toalha sobre a cama, tampa levantada no banheiro, bagunça masculina no meio do meu guarda-roupa. Quando terminei de piscar, já havia um número na agenda e você já almoçava com minha família e se esparramava no sofá como se ele fosse seu. Quando eu percebi, você já era dono do meu coração e da minha vida. Havia me cativado. E, ainda assim, eu continuava livre, ao seu lado, e feliz, nos seus braços.


Sem que você, sequer, se desculpasse por ter virado meu mundo de cabeça pra baixo e transformado a minha vida em sua vida. Sem que eu, sequer, percebesse que você estava me virando do avesso sem nenhum aviso ou rota de fuga. Quando dei por mim, eu já era, terrivelmente, sua. Sem que eu pudesse fazer mais nada além de ser sua. Não pediu licença, não limpou os pés da no tapete, me tomou para você sem me perguntar se eu queria, se eu te queria. Como se sempre soubesse que, ao não me dar outra escolha, ao não me pressionar, ao não me cativar e me prender, meu destino fosse só você.

Você estava certo.

Quando dei por mim, meu destino se tornou só você.

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