quarta-feira, 7 de março de 2012

Vou Seguir Sem Você

Não sei como começar essa carta. Para ser sincera, nunca sei. Mas agora é mais difícil. Me recuso a ser formal e colocar seu nome inteiro no começo. Mas também não posso usar nenhum apelido que antes estava sempre em nossas conversas, porque ele já não cabe mais. O que é uma pena. Eram apelidos muito carinhosos e divertidos. Você se lembra? Não tenho certeza se sim.
Sei que pode estranhar a carta, não pelo fato da carta em si, porque sabe que adoro escrever, mas é que faz tanto tempo, não é? Tanto tempo desde a última vez. Vai fazer um ano. Na Pascoa.  Difícil esquecer. Não quero brigar –em algum momento eu quis? –é só um desabafo mesmo. Um adeus.
Adeus.
Dizem que nosso pesar tem cinco estágios: a raiva, o medo, a culpa, a depressão, e finalmente, a aceitação. Você precisa passar  por todo o processo para aceitar. Eu passei. Doeu, mas eu passei.
Na raiva eu te odiei. Odiei que você me jogasse na cara tudo aquilo que jogou, por ter me dito verdades tão doidas e inaceitáveis. Odiei não ter tido algum reconhecimento por tudo o que fiz –ou pelo menos tentei –por você.  Sempre ali, ao seu lado, tentando te ajudar. No angustiante e doentio medo, tive medo de você me odiar –embora deva ter me odiado –Tive medo de esquecer tudo o que passamos juntas, todas as brincadeiras e conversas, todas as tardes preenchidas por risos que doíam a barriga em assuntos que só a gente entendia e conseguia achar graça.
Na culpa sentei-me aos bancos dos réus, e, sem esperar que começassem o bombardeio de acusações, me culpei. Culpada por ter sido grossa. Culpada por te ajudar. Culpada por ter me intrometido de mais. Culpada. E esperei a sentença com calma, porque a depressão ainda não havia chegado.
Mas chegou.
Chegou  esbaforida, pedindo desculpa, entrando sem bater. Toda suada e sem elegância, tomando o espaço que lhe pertencia (e todos os outros em volta), sem pedir licença, e trouxe com ela seu amigo inseparável, sua essência, sua alma: o choro.
Felizmente esse estagio passa rápido, ela não é dada a despedidas, diferentes do modo como chega, vai-se embora discretamente, no meio da noite, como uma fugitiva, e quando você acorda não tem mais vontade de chorar, embora quisesse, e até consegue sorrir, embora ache errado.
E, então, depois de todo esse sofrimento, você começa a aceitar. Aceita que não é perfeita e falha. Aceita que a outra pessoa também não é perfeita e também falha. Mas, principalmente, aceita que suas relações são como pequenos livros e que o fim é inevitável. Nada nessa vida é eterno, nem a felicidade, nem a tristeza, nem o amor, nem a amizade. Um dia as coisas acabam. Pessoas se vão. Lembranças ficam.  Outro ciclo recomeça. Não há como lutar contra isso.
Eu protelei o final o máximo que dei, em parte porque não queria terminar uma amizade tão linda, em parte porque achava que tinha conserto. Queria que nossa amizade fosse at infinittun, que depois desse pequeno parêntese ela retomasse ao que era antes. Doce ilusão. Te enviei uma carta, que, entre outras coisas, perguntava se você sentia saudade. Esperei sua resposta como um estudante espera pelo resultado do vestibular. Depois de alguns dias, você respondeu. Disse que estava sem tempo, mas que se eu esperasse poderíamos conversar. Eu esperei. Por que não?
E esperei. E esperei. E esperei.
Veio novembro, as férias. O Natal chegou. O ano-novo também.
Continuei a esperar. Meu aniversario passou. E, então, veio o carnaval.
Quatro meses depois, cansei de esperar.
Então você me mandou uma mensagem. Curta. Uma frase. Quando eu já não esperava nada mais. “Esqueci de te responder”, foi o que você disse.
E acho que você pode não ter percebido, mas eu percebi. Numa clareza tão profunda que me cegou. E ao mesmo tempo me fez ver tudo de novo. Não importava o que respondesse,  o que conversássemos, não importava que sentíssemos saudade, nossa amizade já havia acabado. Só faltava oficializar com a palavra FIM.
Hoje não acuso, não me culpo, não choro. Ainda lembro, é verdade, e fico nostálgica perguntando se ainda seriamos amigas se tivéssemos agido de outra forma.  Será? Talvez. Não dói mais. Incomoda, é claro. Às vezes coça. Mas está cicatrizado. E não sangra mais. Caio Fernando Abreu, um mestre da nossa literatura, escreveu que “Sofrer dói, dói e não é pouco. Mas faz um bem danado quando passa”. E passou.
Hoje apenas agradeço. Agradeço por ter te conhecido, pelas risadas, pela amizade, pelo que me ensinou. Agradeço pelas lágrimas também. Por que não? Mas as partir daqui, sem mágoa e sem rancor, coloco você na minha caixinha de lembranças, no fundo do meu coração e sigo sozinha.
Vou me lembrar de você. Vou sentir saudade. Vou desejar que daqui uns anos, depois de amadurecermos, encontramos de novo e recomeçamos a amizade. Não de onde paramos. Mas do começo. Vou derramar ainda algumas lágrimas, certeza.
Mas nesse momento, acabou. Vou colocar esse livro na estante de livros lidos. E seguir sem você.


3 comentários:

  1. Adorei Nandz

    “Sofrer dói, dói e não é pouco. Mas faz um bem danado quando passa”. A mas pura verdade ;)

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  2. "Não dói mais. Incomoda, é claro. Às vezes coça. Mas está cicatrizado. E não sangra mais. Caio Fernando Abreu, um mestre da nossa literatura, escreveu que “Sofrer dói, dói e não é pouco. Mas faz um bem danado quando passa”. E passou."

    Mto bom!
    Descrevendo momentos da minha vida esse texto. :)
    <3

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  3. tudo que eu precisava pra hoje... obrigado por suas lindas e sinceras palavras.

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Comentários

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