quarta-feira, 9 de julho de 2014

Sobre Uma Dor de Cabeça Chamada Você



Minha cabeça lateja. Dentro dela, uma banda de música desafinada refaz os arranjos o tempo todo e solta um monte de notas musicais sem sentido. Deve ser uma mistura de dó-mi-la-si-re-re-re-re-siiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii agudo. Eu não entendo nada de música, mas entendo de dor. Ou pelo menos ando entendida dessa minha dor de cabeça que, vejam, não me larga há mais ou menos uma semana. Eu digo pra todo mundo que não é nada, é só rinite, pra que eu vou ir ao médico se ele vai dizer exatamente isso? Sabe aquele resfriado que tu pegou, pois é, desencadeou essa rinite, esse nariz entupido, essa sua dor de cabeça aguda. Todo mundo me manda ir ao médico e te juro que me sinto um pouco amada, mas não vou. É rinite, gente, nada grave. Mas escondo o medo horroroso de descobrir que na verdade é uma doença grave, sem cura, sem voltas, sem remédios e por isso adio ao máximo a ida ao consultório do doutor.

Estou morrendo. Quer dizer, todos estamos, não é? A cada piscada, a cada segundo, a cada vez que o mundo balança e nos derruba, a cada vez que alguém sai da nossa vida e bate a porta (ou nem precisa bater, encostar, nos proteger do frio que chega com a saída de alguém): estamos morrendo. A gente só não se dá conta, ou finge que não se dá conta, ou nos iludimos e dizemos que tudo bem, vai demorar muito tempo para que eu finalmente morra, vá para debaixo da terra e perca tudo o que até agora conquistei.

Dentro do ônibus indo pra casa depois de um dia infernal –e sem você –o motorista tá com o rádio ligado numa estação bem brega de amor não correspondido, onde os ouvintes pedem música praquele cara que te chutou, aquela menina que não te nota, e, até, pros presos da cidade. É um quadro famoso de uma estação famosa. Porém, insuportavelmente romântica. E não me levem a mal: eu amo um romantismo. Na medida, como a gente é, não esse descambado e sem sentido que o locutor de voz grossa faz parecer. As músicas me fazem querer vomitar. A dor me faz querer vomitar. Fecho os olhos e tento desligar da frequência do rádio antes que eu grite praquele motorista desligar aquela bosta de estação. Ele não tem culpa. Ninguém tem culpa. Mas minha dor de cabeça está insuportável.

Penso em você.

E penso que a banda que toca na minha cabeça deve ser a banda preferida que você escuta. Uma dessas coisas barulhentas, você que está lendo me entende? Ele diz que não. Diz que é a coisa mais harmoniosa que já ouviu. Olha só essas notas juntas, essa letra, essa melodia, a voz do cara, e, como é que você pode não gostar? Dou um sorriso porque sei que ele nunca entenderia. Ele é tão ligado à perfeição que isso às vezes assusta. 

Quero dizer por que a banda dele não é tão boa assim mesmo com todos seus arranjos perfeitinhos milimetricamente testados para não desagradar o ouvido de ninguém que entenda um pouquinho de música. Mas sei que nunca o convenceria. Só penso: pobre coitado, nem percebe que a graça da vida está nas imperfeições e nas desarmonias, nos confrontos e nas dissonâncias, que é tudo mais bonito quando um oposto se liga ao outro mesmo que não combinem em quase nada, pois a beleza toda está na insistência em ficar juntos por amor ou poesia. Que melodia boa é melodia que toca na gente lá no fundinho da nossa alma e faz uma música que só a gente consegue ouvir, sabe, que diz tudo aquilo que a gente anda sentindo e tudo aquilo que às vezes queremos tanto e tanto e tanto sentir.

A banda dele faz um barulho infernal dentro de mim em contrapartida com o barulho calmo que ele me oferece sempre que eu deito nos braços seguros que ele tem. E é disso que eu gosto: do silêncio, da paz, da proteção e do amor que posso aqui sentir. Abro os olhos e tento mudar a frequência que está na minha cabeça, que é pra ver se diminui um pouco desse dó- dó-mi-la-si-re-re-re-re-siiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii agudo ou seja lá o que é que está tocando aqui. Não entendo nada de música. Nem de dor de cabeça. Mas te juro: é rinite.

Ou talvez seja só mais uma dor de cabeça que traduz tanto meu medo de te perder, que eu chamo essa dor de cabeça de você.





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