sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Feito Chuva de Verão




Ela diz que superou. Diz que já tá em outra, que ele já era, que de babaca o mundo tá cheio e ela é boa demais para sofrer por amor. Não foi isso que ele disse antes de bater a porta, gritar xingamentos, jogar dois anos, dois meses, duas semanas ou dois dias na sua cara de um relacionamento que tinha tudo para dar certo e acabou? Que ela era boa demais para ele? Ela era mesmo. Ainda bem que ele sabia disso.

Ela diz que já passou. Que foi tipo chuva de verão as três da tarde de um sábado em que o termômetro bateu 35 graus na sombra. A chuva veio como se quisesse refrescar um pouco os corpos suados, colados, grudados e aquela preguiça que o calor demais sempre nos dá e depois que molhou, encharcou, lavou o corpo e a alma foi embora sem avisos e sem enchentes, sem carregar mais nada do que um peso desnecessário que nenhum dos dois mais aguentava carregar.

Diz que foi só isso. E completa com um sorriso e um “é sério” de quem quer mesmo convencer quem tá ouvindo, reparando, observando e a lendo de que já virou a página, arrancou a folha, guardou o livro e começou outra história. Foi bom, mas acabou. Foi legal, mas acabou. Deu certo por esse tempo que pode ter sido dois anos, dois meses, duas semanas ou dois dias, mas acabou.

Porque no fundo não importa quanto tempo você fica com a pessoa, quando chega ao fim a sensação sempre será a mesma: eu não conheço mais você, talvez nunca tenha conhecido você. O você que eu conhecia – o meu você idealizado – nunca me abandonaria num dia quente a deriva para me afogar sozinha. O você que eu conhecia prometeu um para sempre que chegou ao fim. Não importa quantos dias dividiram, quantos telefonemas trocaram, quantas mensagens foram enviadas e juras foram feitas, quando o ponto final é dado todo o resto é esquecido e você tem a nítida sensação que dividiu sua vida, sua história, seu coração e seu amor com um completo estranho. Porque no fundo somos todos estranhos uns aos outros e não conhecemos ninguém (nem a gente mesmo, voilá).

Ela diz que já esqueceu. Que quando se arruma, não pensa que pode trombar com ele por aí com aquele sorriso cínico de canto, torto e sacana. Que se trombar não vai sentir nada – na-di-nha-mes-mo – do que um dia achou ter sentido. Que não vai vir a sua mente as boas lembranças e que já apagou todas as lembranças ruins – inclusive aquela dele saindo batendo a porta, a chamando de vadia sem coração e dizendo que acabou. Ela diz que já era, tá em outra, mudou os ponteiros do relógio e redefiniu a direção. Distribui sorrisos amarelos e olhares desacreditados para cada alguém que se aproxima falando do amor. Amor? Ela quase ri consigo mesma, mas ainda não perdeu a empatia e a solidariedade, e, ainda que em silêncio zombe daquela pobre alma, apenas bebe seu drink e pensa na bobeira que a outra pessoa ainda acredita.

Está seca, você entende? Não é que ela não se importe ou que para ela já acabou porque o amor chegou ao fim, mas porque ela deixou de acreditar na hora que destruíram seu amor. Acontece com quase todo mundo. As partidas nos partem e, em nosso desespero de nos juntar correndo e estar próxima para outra, a gente acaba se perdendo por aí e por aqui, nas camas estranhas e numas ideias malucas, nas festas sem razão e na felicidade sem verdade, só para provar pro facebook, pros seus amigos, para seu reflexo no espelho e para ele que te largou que tudo bem, acabou e você entendeu tão bem isso que nem precisou fazer um escândalo, chorar, se embrulhar na cama porque foi logo dizendo que passou – feito chuva de verão.

Ela fala que nem se lembra dele. Mas ainda guarda o número na agenda, ainda salva os históricos de conversa e ainda tem uma pasta escondida no computador com todas as fotos meio malucas que todo casal tira e não mostra pra ninguém. Ela ainda muda a música que era deles que toca em seu iphone, mas não conseguiu apagar ou desligar o emparelhamento da letra com a história que viveu. Ela ainda precisa de um pouco de maquiagem pra esconder as olheiras que mostrariam que ela não anda assim dormindo tão bem em lençóis que ela não conhece. De vez em quando ela stalkeia o seu perfil, mas não assume para ninguém, só para ver se ele está tão bem quanto ela. E, merda, ele sempre parece melhor.

Ela jura de pé-junto-pela-mãe-mortinha que já passou. Que foi tipo chuva de verão num dia de 35 graus. O que ela não conta para ninguém e nem sob tortura é que ela permanece naquele dia de 35 graus e que mesmo sabendo que a chuva já foi embora, espera na sombra ansiosamente o momento que ela voltará para molhar seu corpo e refrescar sua alma (só mais uma vez) para ver se ela consegue se livrar da dor que ainda carrega em seu coração pelo fim daquele maldito amor.


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