Desvio de rota

Queria dizer que ainda é cedo, mas tudo me parece tarde demais. O tempo passou e a gente se perdeu. Perdeu a conquista do primeiro carro, da primeira boa oportunidade de emprego, da primeira viagem internacional. Não estávamos juntos quando meus pais se separaram, quando meu tio faleceu ou quando descobri que ganhei um sobrinho/afilhado. Seu número foi digitado no meu celular todas essas vezes e eu desistia antes de apertar o verde. Já não ouço as mesmas bandas, já não uso a mesma maquiagem e aquele colar que você me deu já arrebentou. Assim como o nosso contato que foi cortado abruptamente por nada. Pelo tempo simplesmente. Pela vida. 

Vez ou outra volto a sonhar com você e tento decifrar, talvez, como um pedido de socorro. Um clamor da adolescência. De quem éramos. Jovens inconsequentes que atropelaram todas as escolhas. Como uma retomada de tudo que começou e parou. Eu sei que não há volta, mas esse amargo não passa nem com uma quantidade absurda de açúcar. Um gosto indefinido de uma história não definida com sentimentos abortados.

Anos de tudo o que não aconteceu entre a gente. Você se envolveu com outras pessoas nesse período e eu também, só que sempre faltou algo. Ainda falta porque, inclusive, estou com alguém, mas a verdade é que você ainda me desestrutura. Eu tento tanto ficar por inteiro nessa relação e não consigo porque suas memórias sempre voltam. Ou melhor, nunca foram embora. Não nos falamos, mas sei dos seus passos porque continuo me matando um pouco quando te stalkeio em cada rede. 

Não sei se você sente o mesmo, mas acredito que tudo só cessaria se ficássemos juntos. Ainda que a gente se quebrasse mais ainda. Mais do que já sofremos. E tentamos. E desistimos. Seria necessário ir até o fim, acabar com qualquer vestígio para seguirmos leves. Um acabou carregando a bagagem do outro pela estrada e não dá mais para pagar por esse excesso em cada aeroporto. Não tenho mais dinheiro e nem emocional para aguentar. 

Só que já é tarde. Nossos caminhos não fazem mais nenhuma conexão. Trocamos de estados, de círculo de amigos e, principalmente, não conseguimos nos encontrar na mesma fase da vida. Quando você quis algo, eu pulei o mais rápido que pude dessa história e, quando eu me abri, você já tinha outra pessoa em seus planos. Agora, nós dois já nos esgotamos tanto que não dá para alimentar algo inviável e que não condiz mais com nossos atuais momentos de vida. Há diferenças demais em nossas vivências. Ainda que doa. Ainda que eu queira. 

Sorte que eu nunca acreditei nesses filmes de sessão da tarde em que tudo se resolve e qualquer problema fica pequeno quando os 120 minutos se aproximam. Nossa história deve ter sido o trailer ou sejamos protagonistas de filmes diferentes. Ou, talvez, eu seja o livro e você, a adaptação para o cinema. Nunca fica igual, partes são sempre omitidas e a gente sempre reclama quando sai da sala escura. Formatos e meios diferentes de um mesmo enrendo. Mídias opostas à procura de convergência. Os letreiros já subiram e o livro já foi fechado. O difícil é compreender que por mais que eu releia e reveja milhares de vezes, o final será sempre o mesmo. Separados e distantes em todos os sentidos.

Desviamos a nossa rota, porém sigo tentando reencontrar com o meu norte, com o meu equilíbrio, com você.