Acabou. Dá para ver pelo modo como se olham e pelas vezes
que preferem nem se olhar. Dá para ver como eles nem ao menos brigam porque se
enfiaram num silêncio e não sabem mais como sair. Acabou e a melodia da música
que falavam deles começou a ficar insuportável, ele perdeu o ritmo e ela está
procurando outra canção só para ela. Dá para ver pelos telefonemas mudos, o “eu
te amo” no automático, os beijos mais frios do que as temperaturas mais baixos
do inverno.
Dá para ver pela indiferença dele que finge que não vê
enquanto assiste futebol e bebe cerveja. Pelo jeito com que ele parou de
enxerga-la, de escuta-la, de espera-la. Acabou a vontade de estar junto, a
necessidade de se tocarem, o prazer de se olharem. Dá para ver pelo modo com
que ela anda sorrindo, pelo cabelo quebradiço, pelos pés arrastados pelo
apartamento. Acabou o café e nenhum deles se levantou para fazer outro. Acabou
a paciência e a falta dela também. Acabou a vontade de brigarem e mandarem um
no outro pra ver se as coisas melhoravam. Acabou os sonhos, os planos, o futuro
que queriam porque acabou o presente para aqueles dois.
Dá para ver pelo modo como não se procuram, pelas discussões
que não tem, por todas às vezes que ela fica em casa enquanto ele sai. Acabou o
ciúme e a insegurança. Dá para ver pelos telefonemas que ele recebe e ela finge
que nem se importa. Pelas vezes que ela olha no relógio como se esperasse a
hora que ele teria coragem de ir embora. Acabou a saudade, o desejo e o açúcar.
Acabou a pimenta também. Dá para ver pelo molho alho e sal que ela prepara na
cozinha. Acabou a vontade de estar junto, a bagunça e o barulho. Acabou a
doença e a paixão. Dá para ver pela cama silenciosa, pela falta de palavras e a
distância que os corpos estão. Dá para abraçar o mundo e não dá para abraçar um
dos dois.
Acabou as portas batidas, a bagunça da sala, o tumulto da alma.
Acabou o coração disparado, o embrulho do estômago. Acabou a fala, o discurso,
a felicidade e o desejo. Acabou para ele, acabou para ela, acabou para os
dois e acabou a vontade de recomeçar.
Acabou o café.
Dá para ver, de longe, que já acabou para ambos aquele tal
de amor.
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