segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Mais Uma Rodada de Natal




-Quanto tempo! Qual foi a última vez que a gente se viu mesmo?

Nem lembra que eu existo, agora vem com esse papinho de quanto-tempo-senti-sua-falta, mas-você-sabe-como-é-a-vida-não-é? Sempre assim, na correria, sempre assim não dando tempo pra se fazer mais nada além de casa-trabalho-faculdade-namorado-casa-trabalho. Mas tempo pro cabeleireiro tem, porque olha só essas pontas sempre brilhando, não é mesmo? Mas tempo pra tomar umas cervejas com os amigos selecionados a dedo no bar, que não me incluem, obviamente, tem. Claro que tem. A gente sempre acha tempo quando quer as coisas. A gente se vira, aperta aqui, se esforça por lá, e no fim 24 horas parece uma semana. Ta, talvez não uma semana se você estiver no final de período, mas mais que um dia com certeza parece.

Vai vir com aquele papo de sempre, quer ver? Vai vir dizer que como-você-tá-magra-e-bonita-e-o-que-foi-que-você-fez-no-cabelo? Como você cresceu hein? Vem cá, e os namoradinhos? Namoradinhas, tia, quero dizer. Namoradinhas e namoradinhos porque eu sou do partido que alma gêmea não tem sexo e a gente não pode sair por aí desperdiçando a chance sem ao menos chegar um pouco além da casca (ou roupa, o que você quiser). Você não vai querer saber sobre os namoradinhos, vai-por-mim. Porque é assim mesmo oh; no plural. E se levantar essa sobrancelha incrédula pra mim eu vou ser obrigada a ser mal educada porque a vida é minha, o corpo é meu, e você sabe, o resto também é meu.

Odeio reuniões familiares. Odeio esse discurso de sempre. Odeio esse povo contaminado com esse espírito natalino se achando o bom velhinho ho-ho-ho. Aí eu venho porque sou obrigada, fazer o que, e aí escuto o de sempre: como você cresceu, que menina bonitinha hein, e a faculdade-namorados-trabalho-o-diabo-a-quatro?

Que o diabo te carregue, velha chata. Resmungo pra mim mesmo enquanto faço cara de Lady Gaga. Pokerface mesmo. Que roupa ridícula, tia. Que cabelo ridículo, prima. Nossa, como é que você não emagreceu ainda? E você, por que é que não engorda? É só isso que passam na cabeça deles. O tempo todo. Isso e obviamente, não se pode esquecer, quando é que vão partir o pernil?

Aí depois vão vir com aquele papinho de sempre que enquanto eu não arrumar um namorado não vou aproveitar a vida. Mas eu juro juradinho que ela não ia gostar da minha resposta, porque eu aproveito a vida sim. Mais do que ela que tem um namorado só desde os sei lá, quinze anos de idade. A prima mais nova já tem aliança no dedo. A outra prima resmunga num canto: com quinze anos eu brincava de boneca. Anram, a gente acredita.

Olha só, meu bom velhinho, no próximo ano vou escrever uma carta pra você e pedir como presente não voltar mais pra essas reuniões tão falsas carregadas de espírito natalino. De verdade, Natal era muito mais legal quando eu enxergava a árvore de baixo pra cima. Agora que posso pegar a estrela do topo eu prefiro mesmo é dormir e não me forçar a passar por essa piadinha do pavê ridícula, por essas conversas de como-é-que-já-passou-um-ano-e-a-gente-não-se-viu-durante-os-meses?

A gente não se viu porque a gente não quis, e é isso. Porque quando a gente quer e quer mesmo é aquela velha história: saudade vira vontade, minutos viram horas e “vamos marcar de nos ver” se torna “larga essa gente aí e vamos ali no bar tomar uma cerveja, que tal?”

-No ano passado – eu digo

Querendo dizer que agora só vamos nos ver no ano que vem, e eu nem to falando daquela piadinha sem graça das 23:59 do dia 31.

Malditas festas de fim de ano.

Quando é que vão partir a droga do pernil?


4 comentários:

  1. O natal é a data em que mais se enaltece o constante pacto de hipocrisia coletiva.

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  2. Eita Nanda, que revolta.. O.o
    P.S.

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  3. Fernanda sendo linda-diva-ótima-lacradora-derrubadoradeforninhos como sempre... Texto perfeito *---------*

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Comentários

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